sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

DESPALAVRIANDO

é molestando
o s s o s
dos vocábulos
que te tornas
magarefe da língua
alarido em feiras
clandestinas
balança ensaiando
a sina
navalha crescendo
a boca
entortando o riso
sobre
passarinhs

&

se dilaceras
as vísceras
das virgulas
apadrinhas
o talho no talho

sangue desfilando
por entre calcanhares
dentes postiços
mordendo gengivas
de mágoas
hálitos lendo
o espelho
das facas.

SUBURBANAMENTE

taipa à tapa
molejo argiloso
barro vencendo o domingo
varas de condão
sustentando o cinza
cães esqueléticos latindo manhãs
o fiado aceso na esquina

litro
lixo
lata

d'água na cabeça

lida
lido
líder

botijão entortando espinha de anjo

vizinho
cachaça
ônibus
fila
conta
jornal

na latrina
intriga
briga

a queixa
o queixa
cela
súplica
voto
desgosto
ira
troco
soco
esgoto

aberto
na fala
na sala

gravidez
vida
riso
risco.


NA TAL INFÂNCIA

O ADOBE
DA MEMÓRIA
LEVA-ME
A QUARTOS ESCUROS
DA INFÂNCIA

UM VELOCÍPEDE VERMELHO
CONDUZ-ME
NA GARUPA
DE UM NATAL
SEM FREIOS.

Seno de Mim

in-constantes pesadelos
dor de sonhos
flor de medos
até parece
que esta guerra
é feitiço
só de número$
o$ que confiro
e os ímpare$
que a solidão
di-vi-de.

MORFOSSINTAXE DA NEUROSE (para Nauro Machado)

o sumo das estrelas
ser-vido
em conchas
de congumelo
nutre mistérios
alimenta astrônomos
d e s e j o s
endeusa a catarse
promove o ciclo do cio
olea o trigo da fala
fermenta o pão da sintaxe
é a baba untando beiras
na derradeira epilepsia do verbo
numa sangria de metáforas.

MAIUS (para minha filha, Erika)

dálias nos olhos de abril
noivando maio
escarlate tingindo
um véu
no abrigo
das nuvens
amarelo que cruza
o vermelho
que nasce
no sol
desta manhã
última de abril
em que
teu choro inaugural
percorre copas
de ipês ziguezagueando
por entre galhos pesados
de pássaros azuis
batizando o vôo
molhado de orvalho
gotejado de sol & brisa
agasalhando-se na asa
cortando o arrebol
na travessia incandescente
de um casal de flash
perdendo-se
no fim do dia.

FLOR SELETA

o melhor poema
ninguém o escreve
ele é pé-de-luz andarilho
por estradas de sonhos
não tem forma nem cheira
nem quer dizer coisa alguma
que o digam
o melhor poema
visita-nos
agriga-nos por dentro
e é sempre um fora.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

ÓPERA DO OPERÁRIO

tijolos e sonhos se revezam
num intervalo de calos e ruga
palmas e pás se acariciam
é o alto muro pulando o homem
aproximando-se do azul
neste comprio sábado
em que supermercados e feiras
crescem nas mãos ligeiras
do operário
que aos poucos some
por trás do seu feito
é de ciemnto e de sonho
seu horizonte
de brita e ferro
sua sorte
o prumo em seu olhar
arquiteta o barro
que se projeta
desenhando
um paredão de ilusões
seu troféu
no fim do dia.

GUETO

Liberdade
regada
a reggae.

NARCISISMO

PENSAMENTOS VADIOS
ATRAVESSAM AGORA
VITRINES DE MÁGOAS
ESTILHAÇANDO ESPELHOS
DE SINS-NÃOS E ONTENS
NESTE INSTANTE DE CACOS
EM QUE NARCISO SE MIRA.

INTIMISMO

Não me alcanço canso
correndo dentro de mim
veloz por entre palavras
na lauda memória
que me risca
num risco
de risos
em meu
rosto.

VÍRGULA

virgem encabulada
entre a prostituta
e a prendada.

VÍRGULA

PAISAGEM

O SOL
COADO
EM TEUS OLHOS
FILTRA O VÔO
QUE PARTE
PARA O BATISMO
DESTE DIA.

InCERTEZA

a dúvida está perplexa
com a certeza desta hora.

CURRICULLUM VITAE DE VATE

discípulo dos que dissipam
bolas de sangue
nas artérias das letras
dos que contemplam
o fogo nos versos
dos que interprtam as pedras
e ouvem seus sussurros
no inverno
e sabem que é hibernal
a sinfonia dos cristais
porque o duelo está decretado
e é com a palavra
pedra pesando
sobre o nervo.

RNHHA

bico de aço
cortando a carne
arrastando o quintal
na dança das garras
olho e olho nos olhos dos olhos
gravatas vermelhas crescendo aos pés
feito lenços molhados de rubro
canção rouca no abismo da arganta
um círculo de sanguinários
na aposta da tarde
cabocos e taquiris
riscando o peito do bravo
trêmulas pernas sustentando pena e pena
no jaquetão rasgado
em uma última água.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

FLOR DE LUZ

Faíscas
nos lábios
das foices
e nos músculos
dos metais
reluzindo laços
de luzes
como reluz
a palha
dos canaviais
noiva do orvalho
contemplando manhãs.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

ESCULTURA DO VÔO

todos esses
cavalos brancos
na estribaria da mente
relincham agora
em cavalgadas
de pensamentos.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

VIDRO DO TEMPO

os cacos da vida vão cor
tando a minha cara
e o sangue aceso vai beijando
os olhos da calçada
da madrugada pálida de outros eus
que empalidecem
desenhando pássaros da verdade
num vôo arriscado sobre a dor
tangidas asas cor
tando o medo
esmiuçando ânsias em ânsias mais ainda.

(Coletânea Poética dos Festivais Maranhenses de Poesia Falada, DAC, 2000)

LABIRINTO

Libertei-me da muralha,
Agora sou escravo das profecias.
Estou nutrindo-me de migalha
Em cada canto das periferias.

Agora sou hálito infame
No cume da cumplicidade.
Entre mil doenças... "Derrame"...
A centelha da humanidade.

Continuo perdido
À procura de outra "muralha"
Agora sou parto ferido
Nutrindo-me de nova migalha...

De nada adiantaram as leituras
Se agora sou somente vestígio
em um ermo de mil amarguras
Não sei mais o que fazer (perdi o prestígio)

Sou agora o único sobrevivente
Deste labirinto medonho.
Preciso de um verso urgente
Para findar este sonho...

(O ERRANTE, 1988)

ENDEREÇO PARA RECADO

moro
em qualquer
canto
em que
o canto
se faz
presente.

ENDEREÇO PARA RECADO

SUFOCAÇÃO

Uns me afogam
Inundam-me de fantasias.
Outros me cortam o sorriso,
Rompendo-me os dias.
E assim vou balbuciando
Com meus versos pródigos.
Sinto o que os outros sentem
O que não me deixaram sentir (?)
E assim vou levando a vida
Sem deixar me permitir...
Outros me sepultam
Sem antes deixar que eu nasça...
E assim vou levando (a vida)
—No cemitério ou na praça -
(O Errante/1988)

HIATO

do abismo a boca é farta
lâminas saltam em cápsulas de grito
ferindo a própria fala
do abismo a boca é aço
suportando todas as línguas
parindo todas as palavras.